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O problema nunca foi Jair

Posted on 19 de novembro de 20214 de agosto de 2025 by americaprofunda

Por: Marcos A. Brehm

Jair sempre foi pequeno e sempre será, seja apoiado ou não pela maioria dos eleitores. Afinal, sua modalidade de pequenez é especial: trata-se de pequenez cognitiva, pois não se sustenta por lógica; de pequenez moral, uma vez que é escancaradamente hipócrita; e de pequenez humana, já que é declaradamente contra os direitos humanos, e portanto desumano por definição. Mas isso não é novidade e não pode ser aceito como tal. Não foi a cadeira que o deixou assim. Muito pelo contrário, ele foi sempre um ser ostensivamente tacanho, orgulhosamente imoral e cotidianamente atroz. E não precisamos ser detetives ou cientistas políticos para perceber isso. Eis algumas amostras, e todas de antes dele sentar na cadeira:

“O erro da ditadura foi torturar e não matar” (2008 e 2016)

“Morreram poucos. A PM tinha que ter matado mil” (1992, sobre o massacre do Carandiru)

“Eu jamais ia estuprar você porque você não merece” (2003 e 2014)

“Para mim é a morte. Digo mais: prefiro que morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo” (2011, sobre gays)

“Ele devia ir comer um capim ali fora para manter as suas origens” (2008, sobre indígenas)

“A escória do mundo está chegando ao Brasil como se nós não tivéssemos problema demais para resolver” (2015, sobre imigrantes)

“Como eu estava solteiro na época, esse dinheiro do auxílio-moradia eu usava para comer gente” (2018)

Além de ideologicamente tosco, nenhuma experiência executiva. Como militar, atuou exclusivamente no campo da mediocridade.  Como legislador se manteve firme no limiar da irrelevância. Daqueles que esperavam que daquela carcaça saísse um estadista, não posso emitir qualquer opinião relevante: não tenho qualquer conhecimento teórico ou clínico sobre psiquiatria.

Mas houveram, e esses vieram às pencas, aqueles que garantiram que alguma pitada de coerência, algum lampejo de competência, ou ao menos alguma gotícula de tecnocracia fria poderia sair dali. E essa esperança foi tanta que, ao verem do outro lado um candidato com sólida experiência executiva e carreira de professor universitário na maior escola do país, mas que infelizmente era do “partido errado”, optaram pela antipolítica declarada. Um discurso antipolítico requentado, diga-se de passagem, que como manda nossa práxis histórica, veio lindamente embrulhado com um laço de patriotismo de ocasião.

E vieram em multidões. E engoliram com goles fartos o fermentado de antipolítica rasa, como se a solução de todos as dificuldades fosse óbvia e clara: o problema de estarmos perdendo o jogo não tinha a ver com os jogadores, mas com a necessidade de que todos eles obedecessem às regras. As regras, em especial aquelas que lhes são inconvenientes, eram claro fruto de um comunismo enrustido, que paradoxalmente nunca deu certo mas domina o mundo.

E essa opção declarada pelo abandono da lógica e do iluminismo, pela desistência da civilidade, pela visão do adversário sempre como inimigo, pode surgir de dois caminhos, situados, aliás, bem longe um do outro:

A primeira opção é a explosiva mistura entre ingenuidade, ignorância e boa intenção, que sempre resultou, com o perdão da palavra, em merda. E não se engane quem ache que nesse grupo tem só iletrado. Tem (literalmente) muito Ph.D. em repimboca de parafuseta, um pessoal que num olhar desatento parece esclarecido, mas que, ao retumbantemente ignorar a existência de uma ciência política, erra sempre o alvo por 180 graus. E não estamos falando de uma leitura técnica de Hans Kelsen e da teoria geral do direito e do Estado. Estamos falando sobre algo bem antes disso: entender que o sistema republicano têm vários problemas, mas que de longe ainda é o melhor palpite numa perspectiva histórica. Trata-se do famigerado “idiota bem intencionado”, uma forma de perigo semovente, mas que nessas horas pode até já estar arrependido. Sendo o caso, pode ser que ainda tenha uma vaga no céu cristão. Mas isso depende muito do grau de idiotice, e não há como saber ao certo.

Já a segunda opção é ainda mais perigosa: trata-se do aproveitador inescrupuloso que sempre entendeu muito bem os caminhos da antipolítica, mas que viu nesse caminho uma oportunidade de galgar corações. E sem nem titubear, embarcou com toda força nisso. Isso aconteceu em púlpitos políticos, religiosos e virtuais, a escolher. E convenhamos: funcionou muito bem. Tão bem, mas tão bem mesmo, que essa turma gostou tanto da ideia e até já começou a surfar na onda da “anti-antipolítica”, que agora é chamada pelo eufemismo de “terceira via”, claramente um nome muito mais elegante. Foi como se o passado recente tivesse sumido por encanto. Agora ninguém mais se lambuzou do outro lado. Agora ninguém mais foi ministro de ninguém. Agora ninguém mais foi pra Paris quando o bicho pegou. E não se engane: essa rapaziada sempre soube muito bem onde dão os caminhos da inconstitucionalidade. Eles só não se importam com isso, e provavelmente já tentam negociar um bom imóvel no nono círculo do inferno, com um barquinho aquecido pra navegar no lago Cocite.

Mas tanto os idiotas quanto os canalhas sempre existiram, não havendo nenhuma novidade nestes perfis, portanto. Mas é aí que aparece o problema de verdade, que nunca se chamou Jair. Jair não me afeta, uma vez que nunca teve meu afeto, mas apenas meu ódio e meu nojo sinceros. O problema de verdade é  que o bolsonarismo enquanto forma de (não) pensar, me mostrou que tudo isso está bem mais perto do que imaginei. A selvageria não está só no palácio do planalto. Está por todos os lados, e provavelmente bem perto de você também. Sempre esteve, aliás, mas agora deixou de ser invisível. Talvez seja a única coisa pela qual agradeço ao Jair.

O problema, portanto não é o Jair, esse grande bosta. O problema é aquele grande camarada que sempre pareceu um grande parceiro, que virou noites intermináveis com você, mas que agora se armou com pistolas e munição em nome da liberdade e de bandido morto. O problema é aquele colega religioso, que sempre pareceu bacana, que sabe tudo de teologia mas abraçou quem defendeu abertamente a morte e a violência como método. O problema é ver aquele grande amigo de viagens e aventuras, que sempre se mostrou esclarecido, divertido e aberto a ideias abraçar um deus cristão que se perdeu no personagem e quer matar o próximo se o próximo for um comunista. O problema é a cientista que não acredita em vacina porque só enxerga o próprio umbigo. O problema é ver aquele médico que outrora parecia ter competência inabalável receitando vermífugo pra tratar vírus, tudo em nome de uma ideologia barata, e que ainda por cima já se encontra no final da data de validade.

O problema, enfim, é perceber que o afeto que havia com certos familiares e amigos próximos se perdeu. E se perdeu porque não havia como não se perder. Se perdeu porque não viu mais razão de existir, não viu vontade em não se perder. Afinal, o coração não tem terceira via. A notícia boa é que se você já tentou negar, já passou raiva, já tentou barganhar e já se deprimiu por causa disso, tudo indica  que a aceitação chega em breve. Se possível, se mantenha longe. Na melhor das hipóteses o afeto some por um tempo, mas na pior das hipóteses vira desprezo. Em dias otimistas, quando o sol brilha e aquece os corações, penso na possibilidade de não serem pessoas ruins, mas apenas pessoas bem perdidas, sob diversos aspectos. Mas em dias pessimistas, principalmente quando chove e faz frio, penso que as pessoas ruins também podem se perder.

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