Por: Ana Flávia Bassetti
Há bastante tempo adquiri o hábito de pedir informações na rua só para mulheres. Por quê? Porque nunca, nesta situação, nenhum homem me disse que não sabia onde ficava a Rua X ou qual ônibus pegar para chegar até o lugar Y. Resultado: muitas vezes acabava mais perdida do que antes por causa da informação errada.Mas, quando falamos de mansplaining – do inglês: man = homem, e splaining = a forma informal do verbo explain, que significa explicar – estamos falando daquela velha cena em que um homem explica algo para uma mulher que ela evidentemente sabe. Ou, quando ele explica algo de forma muito didática, como se ela não fosse capaz de compreender. Ou ainda, quando começa a explicar alguma coisa a uma mulher assumindo, de antemão, que ela não sabe nada sobre aquilo. Tem homem que quer explicar feminismo para mulher, AVC pra médica, teorema de Pitágoras para engenheira, corte à Julienne para uma chef de cozinha… Gente, é sério. Já soube de homem que discutiu com mulher sobre a localização do clitóris. Calculem!
Eu adotei uma cachorra recentemente e, como tenho falado muito sobre ela e da minha jornada na educação canina, essa prática me saltou aos olhos. Um rapaz, com o qual estava tendo um “trelelê” e que acompanhou meu encontro com a Madalena desde o começo, quis explicar como eu deveria lidar de forma prática com as minhas emoções. Aconteceu que, no quinto dia da Madá aqui em casa, me deu um medo tipo “meu deus, serão mais de quinze anos de completo comprometimento com ela: Será que dou conta? Será que vou me arrepender? Será que fiz a coisa certa? Dividi com ele o drama, afinal, parecia ser um cara aberto para conversas um pouco mais profundas. Foi quando ele começou a me aconselhar sobre como eu tinha que amá-la e deixá-la me amar, que eu deveria olhar as coisas boas, e não as ruins. Oras, não se tratava disso. Eu sei que vou amá-la, e que ela, por óbvio (e pela boa ração que eu compro), me amará. A questão era dividir uma insegurança com um amigo. Eu não estava pedindo uma solução, ainda mais óbvia como a que estava me dando.
Outro dia, o namorado de uma amiga veio aqui em casa. Era a primeira vez que nos víamos e, em dois minutos de conversa, ele começou a me explicar porque ela não fazia xixi no lugar certo, o que eu estava fazendo de errado e o que era o certo a se fazer, mesmo depois de saber que eu estava sendo acompanhada por um adestrador. Detalhe: ele comprou um cachorro recentemente que já foi doado como um móvel que não serve mais, mas essa discussão fica para outro dia.
Uma amiga me contou da última que ela passou. Foi até o banco resgatar a previdência privada para fazer a reforma do apartamento recém comprado. O rapaz que a atendeu pediu que ela pensasse melhor sobre o caso pois, ao fazer a retirada naquele momento, teria uma desvantagem financeira. Ela disse estar ciente disso e que ainda assim gostaria de retirar o dinheiro. Ele, não contente, sugeriu que antes de tomar a decisão ela fosse para casa e conversasse com o marido. Ela é solteira. Ela é solteira e inteligente e independente.
São coisas mais ou menos sutis que acontecem todos os dias no ambiente de trabalho, no meio acadêmico, no almoço de família, na mesa do bar, nos relacionamentos amorosos. Falando nisso, tenho amigas que depois de casadas mudaram radicalmente seus posicionamentos políticos, seguindo as convicções dos maridos. Eu nunca vi nem ouvi falar sobre algum caso em que o contrário tenha acontecido. Vocês já?
Ah, mas então os homens não podem mais expor suas opiniões? São tempos em que esta arapuca de “expor a opinião” está armada em todos os lugares, não é? E eu entendo que para alguns seja difícil de entender. Afinal, os homens em sua maioria foram ensinados que devem ensinar as mulheres. Foram ensinados que devem saber tudo, e muitos acabam achando que sabem mesmo. Foram ensinados a não demonstrar fraquezas, a dar conta. E nós, mulheres, também acabamos muitas vezes procurando uma opinião masculina, pois ela nos foi vendida desde muito cedo como sinônimo de segurança. Mas você, homem, pode, antes de explicar algo a uma mulher, verificar se ela pediu sua opinião. Você pode abrir espaço para perceber que mulheres são intelectualmente capazes e que podem e vão saber mais sobre algumas coisas do que você. Você pode tentar baixar esta “ansiedade explicativa” e exercitar essa coisa linda que é a escuta.
Há muito caminho ainda. E a caminhada é, para nós e para eles, a passos de formiguinha. Quanto tempo vai levar? Qual o tamanho do passo de uma formiga? Quem aí sabe?
Imagem: Jason Adam Katzenstein.